Ele me vê numa festa e consegue meu telefone com uma amiga. Me liga a seco: “gostei de você”. Estremeço. Nem sei que sensação é essa. Ou melhor: não lembro. Como assim, você simplesmente pega meu telefone e…? “Eu gostei de você, quero te ver e nós vamos jantar amanhã. Te pego às 9 horas e vamos num restaurante que abriu aqui perto.” Estremeço de novo. Uma pessoa que nunca vi na vida acaba de decidir a minha noite com tal requinte de certezas que não coube a mim discordar. A voz dele é grossa, firme, rouca. Há séculos não dizia “sim” tão rapidamente.
Não que eu me faça de mocinha… mas minha vida amorosa se divide entre duas situações tediosas: eu dando em cima de rapazes que ficam inseguros por causa do meu jeito direto. E rapazes inseguros dando em cima de mim de jeito tão indireto que caio no sono ou sou honesta: “putz, cara, tu é muito bobo”. Agora me liga um ser humano, com essa confiança toda, e praticamente me alista a sair com ele. Não sabia o que era estremecer assim, da ponta dos pés ao cerebelo, desde os meus 13 anos. Era apenas porque eu era uma menininha virgem. Me sinto novamente essa menininha virgem e isso, diferentemente do que pensava, me dá mais tesão. Claro que se ele fosse feio ou burro ou brega eu teria dito “não”… mas os feios e burros e bregas jamais ligariam com essa inabalável confiança. Eles ficariam num eterno papo furado pelo Messenger ou pelo chat do Face book. Esse é o tipo de homem que se me mandar ficar numa posição dessas em que nossa face é enterrada no chão, eu topo. Apenas porque se doar a essa força maior chamada “homem seguro, macho e com atitude” é o maior prazer que uma mulher pode sentir. Poder ser frágil, em meio a tudo isso que somos o tempo todo, é um respiro em nossas vidas. Danem-se os moços que vêm aqui em casa com suas faltas de ar, medos existenciais e ataques do miocárdio. Ah, que lindo que o homem está mais sensível hoje em dia! Eles choram e fazem terapia, sentem medo de tudo e cozinham e não se incomodam que o carro e o apartamento e a grana para viajar são sempre meus. Ah, que saco.
Só sei que quando aparece uma maravilha dessas, me ordenando que jante com ele, com educação e sem enrolação — meu Deus, como fica lindo viver. Ele não faz piadinhas sexuais, ele olha profundamente dentro dos meus olhos. Ele devora meu raciocínio porque todas as suas intenções são claras demais para que eu o transforme em mais um personagem fraco da minha novela mexicana. Eu não o “invento” porque ele é óbvio e, pela primeira vez, não sinto a menor saudade do mistério. Mistério é arma de plástico com água dentro. Um homem que sabe o que quer é uma metralhadora. Ele não precisa “armar a situação”. Ele não pega na minha mão, ele SEGURA. De novo, me sinto estremecer.
Esse cara nem é tão bonito ou interessante. Pra falar a verdade, está até um pouco acima do peso e, profissionalmente falando, alguns anos atrás de mim. Mas ele encarna Javier Barden e para mim isso já é 98% melhor do que o mercado tem oferecido ultimamente. Trata-se de um sobrevivente de uma espécie em extinção: seres humanos que, por ser musculosos e cerebrais, tornam a nossa luta diária menos dolorosa. Vamos para Barcelona trepar como loucos porque eu me acho tesudo pacas e não tenho dúvidas de que você estará segura e feliz ao meu lado? Vamos, Javier! Por favor! Me ajude a deletar de minhas redes sociais e celulares os angustiados broxas que tanto me usam da pior maneira possível: para conversar. Cansei de ser despida espiritual, intelectual e psicologicamente. Cansei de discutir livros e filmes e peças de teatro. Daqui para a frente, você manda em mim e eu serei eternamente obediente. Mas, se me permitir um último desejo, eu lhe peço: tem como você arrotar e coçar o saco? Ah, não para! Não para!



Tati Bernardi é escritora e roteirista. Escreva para ela: tati.bernardi@abril.com.br